domingo, 31 de agosto de 2014

Poema 195

Será que em algum lugar do mundo 
há alguém a pensar o mesmo que penso agora? 

E de que adianta pensar, 
se nenhuma palavra traduz o que cala? 

Existe um tempo em que só se colhe 
o que não se plantou: 

 o desejo (preso) manda beijos, abraços 
e despeja (para todos os lados) 

em vez de fábulas, 
mágoas; 

em vez de final feliz, 
a vida sem sal que (burramente) se quis.
(por Filipe Couto)

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Poema 194

Li no jornal que amanhã talvez dê praia, 
e ouvi meu horóscopo no rádio: "Geminianos, fiquem animados! 
Grana alta e mulher amada vão surgir num piscar de olhos!" 

Era dia de consulta com a terapeuta, 
e ela me garantiu que, sim, a felicidade existe, 
que a vida é uma beleza e que estou no caminho certo para tê-la. 

Na volta pra casa, não peguei um sinal fechado. 
Estacionei o carro, desci para comprar um guaraná gelado 
e vi no poste um cartaz em que estava sentenciado: 

"Mapa astral, leitura de mão, jogo de búzios, 
apelo ao santo: é tudo a mesma merda. 
Ninguém adivinha o que a vida nos reserva. 

Por isso, amigo, não ouça ninguém, não compre barulho, 
não acredite em promessas: não existe destino ou futuro. 
Acredite: amanhã, o que pintar é lucro!" 

Agora, já no quarto, tomando aquele uísque 
doze anos reservado para festas, rasguei a última foto dela 
e escondi a esperança num poço; num poço sem fundo. 

E, amanhã, poeta do poste, garanto: 
meu dia será maravilhoso. 
E único.
(por Filipe Couto)